Maior obra ferroviária do país avança 1 km por dia em Mato Grosso
Escrito por Jornalismo Nativa em 18 de Novembro, 2025
A maior obra ferroviária em andamento no país, com investimentos de R$ 5 bilhões e cerca de cinco mil trabalhadores nos canteiros, atingiu a marca de 73% de execução física e deve ficar pronta em meados de 2026.
Tocada pela Rumo, empresa de logística do grupo Cosan, a FMT (Ferrovia de Mato Grosso) entrou em ritmo acelerado antes da temporada de chuvas e vai rasgando o interior do estado em uma velocidade impressionante.
Com quase toda a terraplenagem realizada, além de boa parte dos viadutos e pontes já entregues, a instalação de dormentes e trilhos avança até um quilômetro por dia.
Na prática, a FMT é uma extensão em 743 quilômetros da Malha Norte, que hoje capta a safra de grãos de Mato Grosso a partir de um megaterminal logístico em Rondonópolis.
Os caminhões carregando soja, milho e farelo às vezes percorrem mais de 500 quilômetros das fazendas até embarcar essa produção nos trens da Rumo, que atravessam todo o interior paulista até chegar ao Porto de Santos (SP), em uma jornada que dura 76 horas.
A nova ferrovia é um megaempreendimento com capital 100% privado, que promete levar os trilhos da Malha Norte até o coração do agronegócio brasileiro, reduzindo a distância percorrida pelos caminhões para o escoamento da safra e baixando a conta do frete para os produtores rurais.
Se as fazendas brasileiras já são um exemplo de competitividade da porteira para dentro, a FMT pode derrubar os custos da porteira para fora.
“O ganho exato depende da distância. Em trajetos de mil quilômetros, pode-se obter uma queda de 50% na comparação com o frete rodoviário. Isso significa menos custo de transporte ao produtor, gerando produtividade e renda para a economia como um todo”, diz o secretário nacional de Ferrovias, Leonardo Ribeiro.
A FMT começou a ser construída em 2022 como autorização estadual — modelo que foge das amarras tradicionais de uma concessão comum. Diante da magnitude, o projeto foi dividido em três fases.
A primeira fase, de Rondonópolis até um novo terminal que está sendo erguido entre os municípios de Dom Aquino e Campo Verde, tem 162 quilômetros e deve entrar em operação no começo do segundo semestre de 2026 — a tempo de escoar a safrinha de milho em Mato Grosso.
“Os contratos comerciais já estão negociados”, afirma a vice-presidente de regulação e relações institucionais da Rumo, Natália Marcassa.
O Terminal BR-070 terá capacidade para movimentar 10 milhões de toneladas por ano e ficará nas bordas do Vale do Araguaia, região tida como uma das mais promissoras do país para o crescimento da produção de grãos.
As fases 2 e 3 vão levar os trilhos da Malha Norte para Nova Mutum e Lucas do Rio Verde, respectivamente, mas ainda não há data cravada para o início das obras. Um ramal para Cuiabá, também sem data certa, completa o projeto. Os traçados de engenharia estão sendo refinados.
Quando o empreendimento foi concebido, a Rumo falava em um investimento total de R$ 14 bilhões a R$ 15 bilhões, considerando todos os 743 quilômetros de extensão da Malha Norte. Agora, prefere não fazer estimativas.
A decisão sobre os próximos passos deve ser tomada pelo conselho de administração entre dezembro e janeiro, segundo Marcassa, analisando três pontos: investimentos necessários, potencial de receitas e custo de capital para financiar as obras.
“A taxa de juros é uma dor para todo mundo que investe em infraestrutura no Brasil”, reconhece a executiva, mas ponderando que a Rumo é uma empresa listada na B3 e bom rating (avaliação de risco).
Isso facilita a emissão de debêntures, inclusive no mercado internacional, e amplia as possibilidades de financiamento. Há conversas com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para mais um empréstimo. E o capital próprio da empresa continua sendo uma possibilidade.
“Acreditamos muito nesse projeto, achamos que é um investimento que se rentabiliza, mas o faríamos mais rapidamente se as taxas de juros fossem mais baixas”.
Enquanto uma decisão não sai, o andamento da fase 1 impressiona quem percorre as franjas da BR-163, no sul de Mato Grosso.
Dois carregamentos de trilhos, com 89 mil toneladas, chegaram da China para atender às obras. É o equivalente a nove vezes o peso da Torre Eiffel.
Uma fábrica de dormentes foi inaugurada recentemente em Rondonópolis e continuará ativa mesmo depois da inauguração de toda a ferrovia, abastecendo a rede de 14 mil quilômetros da empresa com peças de manutenção.
A ponte sobre o rio Vermelho, com 460 metros de extensão e maior na primeira etapa do projeto, foi usada pela primeira vez por um trem quando a reportagem da CNN visitava o local.
Aos poucos, ganha corpo um novo caminho que ajudará a mudar a cara da logística brasileira.
Custo do frete
De acordo com o PNL (Plano Nacional de Logística), a participação das ferrovias na matriz de transportes brasileira deve subir dos atuais 17% para 35% em 2035.
“É um objetivo ambicioso, mas possível”, afirma o secretário Leonardo Ribeiro.
Em países com mais alternativas de transportes, o escoamento de cargas por ferrovias representa uma economia de 30% a 40% do valor normalmente cobrado pelo frete rodoviário, segundo o Movimento Pró-Logística, ligado a organizações do agronegócio em Mato Grosso.
Para os produtores rurais, a extensão da Malha Norte é muito bem-vinda e deve gerar redução de custos, mas de forma relativamente limitada por causa da falta de outras opções de escoamento dos grãos em direção aos portos.
“As ferrovias que transportam grãos hoje no Brasil são monopólios naturais. Então, a base de comparação para o valor do frete continua sendo o caminhão. Se o caminhão faz [um trajeto] a R$ 100, a ferrovia faz a R$ 95 e tudo certo. Precisamos de concorrência”, observa o diretor-executivo do Movimento Pró-Logística, Edeon Vaz.
Outras duas ferrovias de grande porte, em Mato Grosso, estão previstas na carteira de projetos do Ministério dos Transportes.
Um é a Fico (Ferrovia de Integração do Centro-Oeste), que vai de Mara Rosa (GO) a Água Boa (MT), já em obras. Ela conecta-se com a Norte-Sul. Outro é a Ferrogrão, entre Sinop (MT) e Miritituba (PA), permitindo o escoamento da safra pelo chamado Arco Norte.
“Quando tivermos todas essas ferrovias operando, aí sim haverá realmente uma queda significativa no custo do frete”, afirma Vaz.
Embora elogie todas os projetos que permitam escoar a safra de Mato Grosso no futuro, a vice-presidente da Rumo defende que o corredor operado pela empresa — via Porto de Santos — continuará sendo o mais viável e competitivo.
“É a rota mais barata para chegar ao nosso grande mercado consumidor, que é o Leste Asiático”, diz Marcassa, lembrando que navios graneleiros não têm passagem permitida pelo Canal do Panamá.
Isso tira boa parte da atratividade do escoamento pelo chamado Arco Norte, segundo ela, além de outros riscos intrínsecos a essa alternativa, como a falta de calado suficiente para as embarcações que usarem hidrovias durante o período de estiagem. “Nós funcionamos o ano inteiro e não dependemos de dragagem”, compara a executiva.
Para o secretário Leonardo Ribeiro, a futura disputa entre ferrovias vai ser saudável e não há risco de demanda que possa inviabilizar um ou outro empreendimento.
“Tem carga para todo mundo. Os estudos projetam que, em Mato Grosso, teremos uma produção de 180 milhões de toneladas por ano em 2050”, conclui.
Fonte: Por Daniel Rittner – CNN-Brasil- O repórter viajou a convite da Rumo
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